quinta-feira, fevereiro 18, 2016

Teoria das Cores

Teoria das Cores

Herberto Helder

Era uma vez um pintor que tinha um aquário com um peixe vermelho. Vivia o peixe tranquilamente acompanhado pela sua cor vermelha até que principiou a tornar-se negro a partir de dentro, um nó preto atrás de uma cor encarnada. O nó desenvolvia-se alastrando e tomando conta de todo o peixe. Por fora do aquário o pintor assistia surpreendido ao aparecimento do novo peixe.

O problema do artista era que, obrigado a interromper o quadro, onde estava a chegar o vermelho do peixe, não sabia que fazer da cor preta que ele agora lhe ensinava. Os elementos do problema constituíam-se na observação dos factos e punham-se por esta ordem: peixe, vermelho, pintor – sendo o vermelho o nexo entre o peixe e o quadro através do pintor. O preto formava a insídia do real e abria um abismo na primitiva fidelidade do pintor.

Ao meditar sobre as razões da mudança exactamente que assentava na sua fidelidade, o pintor supôs que o peixe, efectuando um número de mágica, mostrava que existia apenas uma lei abrangendo tanto o mundo das coisas, como o da imaginação. Era a lei da metamorfose.

Compreendida esta espécie de fidelidade, o artista pintou o peixe amarelo.

Herberto Helder, in Os passos em volta. Lisboa: Assírio & Alvim, 2001.

(Grafiite e aguarela)                                                                                                                                                                                  «in situ» |

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